Onde nasce o nosso desejo? Como ele é montado? Explicado? Acho que nasce bem antes da gente, quando ainda somos poeira cósmica, misturada a um sopro de furacão. Porque acho sim que toda mulher tem disso, tem uma força grande, um olho negro no espaço. E quando viramos corpo somos compactadas , algumas perdem estrelas e meteoritos, outras simplesmente viram nuvens brancas ou chuva rasa, sem muito a dizer. Mas para aquelas que ainda têm essa inquietação, bastante comum nos quinze minutos que antecedem cada tempestade, a essas pergunto: onde nasce o tal desejo?
Acredito que para elas o desejo está junto ao universo de constelações que moram dentro de si. E nesse imenso espaço, onde também existem borboletas e lagartixas, elas cultivam o desejo como uma pequena planta carnívora e sedenta. Porque o desejo nada mais é que isso, estar plantada e querer ter pernas.
E tudo o que sobra são olhares que enxergam mais que a paisagem, são respirações inconstantes, são calores e arrepios que não têm esses nomes pois pertencem a uma criatura inteira que incendeia, vira cinza e recomeça todas as manhãs.
Por tanto não há como separar o desejo da fúria de viver num espaço sideral guardado dentro de si. E talvez isso justifique (ou não) as vontades, inflamáveis e perigosas, tão comuns a essa classe.
Um instante, entre um segundo e outro as separa da louca, essa que vive trancada em casa. Abrem as janelas, deixam que respire o ar fresco da manhã e antes que a gritaria comece fecham tudo. Para reconhecer é preciso atenção. Por isso essas mulheres, essas das quais falo com certo orgulho, são difíceis de encarar. Se olhar lá no fundo é possível ouvir a louca gritar da janela que sai da pupila dos olhos.
Mas, apesar disso, elas não são assustadoras, são intensas, vibrantes e às vezes misteriosamente se calam, num momento de luto com a própria voz. Há aí provas cabais de que são feitas de cosmo e turbilhões. Porque é “preciso atenção para ouvir estrelas”.
E elas sabem de tudo isso, e guardam como se fosse segredo que só revelam quando encontram suas iguais. Que não se parecem na verdade, mas têm em comum esse estado constante de abandono. Nossos desejos são pequenas criaturas, algo entre um gato e um passarinho, que perambula pela casa vazia.
(Valiente).